Revolta de Búzios: Um Projeto Permanente de Felicidade

Entre os boletins exposto nos dias 12 e 20 de agosto, de 1798, nas ruas da Cidade do Salvador, um deles chamou a atenção pela capacidade de enunciar de forma poética e retumbante um anseio coletivo, que também transitou nas tramas centrais da Revolução Francesa (1789), e que encontrou ecos em diversas outras nações pelo mundo afora: Liberdade, Fraternidade e Igualdade. Contudo, para cá, o tempo da felicidade introduz, articula e engrena os outros tempos, o da liberdade, o da fraternidade e da igualdade. A felicidade, por assim dizer, como um estado permanente e promotor de todas as pautas a seguir.

Ainda com referência ao boletim, o trecho destacado acima exprime uma conclamação ao mesmo tempo uma provocação para uma coletividade. Aqui, portanto, cabe lembrar que o desenrolar desse importante levante social alcançou não só a Cidade do Salvador, mas o recôncavo baiano e as terras um pouco mais distantes, como na Chapada Diamantina, mais precisamente na Vila de Rio de Contas. Aqui registro a figura de um Professor, da cadeira de Gramatica Latina, por nome Francisco Muniz Barreto de Aragão, que fora preso em Rio de Contas e depois trazido a Salvador, por ter sido encontrado, na casa dele, livros, poesias e textos que faziam referência ao movimento.

Não demais lembrar que a revolta de búzios contou com uma ampla participação popular e articulação entre diversas camadas sociais, sendo este provocado também a partir de outros movimentos, aglutinando assim pautas oriundas de outras pelejas. Ora, em 1728, o Motim do Terço Velho, por exemplo, foi um evento histórico em plena cidade do Salvador, quando soldados revoltados com os baixos soldos se rebelaram no entardecer do dia 10 de maio de 1728. Esse movimento contou com oficiais e soldados em regimentos nos arrabaldes desta cidade, compreendendo a freguesia de São Pedro e a de Nossa Senhora da Vitória, Nossa Senhora do desterro e Nossa Senhora das Brotas até Itapuã. Esse motim teve como pauta, além da reivindicação pela melhoria dos soldos, a abolição dos castigos físicos impetrados apenas aos soldados inferiores, notadamente negros. A repressão foi deveras punitiva.

Nos sertões baianos, em 1729, ocorreu a proibição de circulação dos chamados Vadios, que seriam indígenas e seus descendentes que não tivessem uma licença para “livre transito”, gerando assim inúmeros conflitos e motins na região do alto Rio São Francisco. Nesse sentido, a corte portuguesa impetrou ao longo do século XVIII, o crime de “lesa-majestade” já previsto pelas Ordenações Filipinas, materializado em “inconfidência” (falta de fidelidade ao rei) que trazia a ideia de que a traição cometida contra a pessoa do Rei, ou seu Real Estado, que é tão grave e abominável crime, comparada a uma doença infecciosa que necessitaria ser extirpada para não gerar novas incidências da moléstia.

Dito assim, se nota o elevado grau de repressão e intervenção no controle social e no impedimento do florescer de pautas, seja de melhoria da qualidade de vida e de sustentos, seja pela liberdade de ir e vir. Seja pela livre expressão. Aqui, vale o registro sobre as chamadas inconfidências Fluminense / Carioca (1771) e a Mineira (1789) que tiveram, entre outras pautas, a luta pela libertação de expressão e a possibilidade de livre publicação de ideias, sem o controle absoluto régio. Ambos tratados com extremo rigor e violência.

Um outro evento, pouco discutido ocorreu durante a revolta de crioulos e crioulas escravizados (as), no Engenho de Santana, em Ilhéus-Ba, em 1789. Este evento produziu um outro capítulo instigante e provocativo deste grande enredo. Crioulos e Crioulas simplesmente paralisaram o trabalho, mataram o feitor, pegaram as ferramentas do engenho e refugiaram-se nas matas do entorno da região. Esse levante traz contornos a serem discutidos amiúdes, uma vez que, a o movimento produziu uma carta, listando uma série de reivindicações, dentre elas a garantia de maior liberdade de ir e vir entre o engenho e suas roças, além da total liberdade de culto religioso, e a possibilidade de eleição, por parte dos escravizados, daquele que iria se tornar o seu feitor. Além disso, o debate sobre a “melhoria nas condições de trabalho” a partir de uma distinção entre o trabalho feminino e masculino também esteve

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